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REVISTA

DO

INSTITUTO HISTORICO E GEOGRAPHICO DO BRAZIL

3. SERIE. — N.° 9. — 1.° TRIMESTRE DE 1853.*

GUERRA CIVIL

OU

SEDIÇÕES DE PERNAMBUCO.

EXEMPLO MEMORAVEL AOS VINDOUROS.

(MS. offerecido ao Instituto pelo Socio correspondente o Sr. Dr. Felippe Lopes Netto.)

PRIMEIRA PARTE.

CAPITULO I.

Em que se dá noticia breve da terra, e dos motivos, que deram principio ás sedições.

Em todas as terras sujeitas ao dominio de Portugal se reputa pela mais excellente Pernambuco; porque na extensão do terreno tem de costa 208 legoas, que são do Rio de S. Francisco, da parte do sul, até o Ceará-Grande para o Norte, té onde chega a jurisdicção do seu bispado, posto que não a do governo das armas e politico, por estar de permeio a Parahyba, que tem o seu a parte. Comprehende dilatados sertões, em que se recolhe numeroso povo de gente, numeravel criação de gados, que os fazem parecer um novo mundo. O clima é o mais salutifero. Contém em si Pernambuco quarenta freguezias, em que se acham oito villas, e tres cidades, e outras de

bastantes vizinhos povoadas.- Duzentos e cincoenta e quatro engenhos de fazer assucar, t mui rendosos, e cada um d'elles com sua capella, e-sacerdote para os sacrificios e sacramentos; além de muitas que ha por varias partes.

Foi esta terra em seu principio, quando descoberta, povoada de pessoas mui qualificadas na nobreza de seus ascendentes, de que hoje fra grandes familias, e d'onde procedem as que pelas mais partes da America se espalharam, e nellas ha de melhor nome. Augmentouse nos cabedaes; e augmentaram-se os vicios de tal sorte, que indignada a Divina Magestade das dissoluções dos homens, desde Hollanda lhe enviou o castigo na era de 1630, que durou 24 annos, como largamente se mostra nas historias que o referem. No fim d'elles intentaram os naturaes, levados do seu valor e brio, lançar fóra aos Hollandezes. Para o que fizeram de pãos agudas armas, que do mato tirando, cada um no fogo a seu modo preparava. Assim se ajustam, e com ellas, e as do seu furor e valor, armados com glorioso nome conseguiram o que emprehenderam: restaurando a sua patria á custa de muito sangue, de muitas vidas, destruição de suas fazendas, e familias, supportando frios, fomes, sêdes, calmas, vigilias, e todas as mais penalidades, e accessorios d'uma ardente e viva guerra, tão continuada, e tão desigual nas forças, como eram as de poucos moradores desarmados, sem disciplina militar, sem munições e mantimentos, contra o poder incomparavel dos veteranos soldados de Hollanda, de tudo bem prevenidos e abastados. E foram tão liberaes os naturaes de Pernambuco, e tão isentos, que comprando tão cara a sua liberdade, e a da terra, sem pensão, nem interesse algum, a deram ao seu Rei, em obsequioso penhor da sua liberdade.

Tem mais, e teve sempre esta terra ser benigna mãi dos forasteiros, agasalhando-os, e fazendo-lhes mimos, sem que os naturaes invejassem a dita de quem os maternos aflagos lhes roubava, antes tratando-os com igual benevolencia, os estimaram sempre, favoreceram, e ajudaram, do que se originou sua ruina; e foram estes beneficios armas que contra si deram offensivas. Porque, não satisfeitos,

ós estranhos, principalmente os mercadores de se verem authorisados, occupando postos e logares da republica, que não são da mercancia; habitos de Christo, que por juramentos falsos conseguiram (como de alguns poderei justificar), justificando-se parentes, sem o serem dos que impossibilitados da inopia, e da miseria por pouco mais de nada lhes venderam os seus serviços, quizeram de todo abater e destruir toda a nobreza, porque isentos ficassem logrando as honras que pelo braço e sangue alheio foram adquiridas.

E trazendo já de longe este intento tão maligno, os que para esta conjuração haviam conspirado, regeitando a ordem mercantil no que o negocio permittia em quanto licito, tractaram só do que désse mais ganancia afim de enriquecer á custa de quem fosse, e sem temor dos encargos das usuras na mora de um anno se dobravam os ganhos do fiado, para serem no outro acredores de todo o rendimento e lucro dos engenhos; e fazendo então arrematar por sua conta em 4 tostões cada arroba de assucar, com a mesma por quatorze satisfaziam aos seus correspondentes, por se não offerecer outra conveniencia melhor do que esta, ou de embolsarem o dinheiro, ou de pagarem as dividas.

D'este modo se puzeram brevemente grossos nos cabedaes, e inflados na soberba; e com tanta confiança que iam os de mais assistencia aos governadores, nos palacios e actos publicos. Em todas estas destrezas deram os modernos mascates, que os antigos não passavam das suas mercancias. E sendo Sebastião de Castro e Caldas, o governador no anno de 1708, acharam em seu genio, para a frequencia de corteja-lo, melhor capacidade, por ter tão pouca que indigno se fazia do logar, e cargo, que occupava, dando máo exemplo em ser, sobre deshonesto e escandaloso, contrario á igreja, e seus ministros, abstrahido dos sacramentos como si christão não fôra; e finalmente em 3 annos, que esteve em seu governo, nem pelo preceito annual se confessava, disfarçando esta falta com estar parte do tempo da quaresma, em que o devia fazer, em Olinda, e parte no Recife.

Com este governador se uniram para os seus negocios e para os

contractos reaes, em que iam interessados, e pela communicação e companhia se facilitou o meio de approvar as conveniencias da noval villa, sobre que se baldaram varios requerimentos antecedentes, que a el-rei se fizeram, e não se conseguiu por então fazerem-se manifestos os prejuizos, que era certo resultarem, e pela informação de Sebastião de Castro e Caldas, que deu a S. M. se occultaram. Vinda que foi a ordem para a criação da nova villa, se ensoberbeceram mais, do que já estavam, os animos d'aquelles moradores do Recife, e com o governador a quem os interesses haviam obrigado, se declararam de todo oppostos á nobreza, tão superiores e com dominio tanto, quanto era o que já tinham nos cabedaes, que pela mercancia lhes haviam usurpado, com o que se desmasiaram na insolencia de tal modo, que impossivel parecia poderem os naturaes já com elles conservar-se porque somente admittiam a si os do Recife por favor, aquelles nobres, que eram do termo, que instavam se concinasse a sua villa. Este foi o motivo das primeiras desconfianças.

Seguiu-se o segundo na divisão e repartição do termo, que o governador com o ouvidor geral haviam de dar á nova villa. No que se descontentou com mais razão o ouvidor por ser de voto se não désse mais, do que tem de freguezia, e com fundamento por ser o povo bastante para a conservação d'aquella republica, em caso que a houvesse, e não ficar a de Olinda diminuta, que em breve tempo perderia toda a estimação, que era o que os do Recife pretendiam. Valendo-se da opportunidade de terem o governador comprado e prompto para o que quizessem. D'aqui se originaram as opiniões e diversidades nos pareceres, seguindo os do Recife pelo empenho que fizeram, eos mais ao ouvidor pela razão, que os ajudava: vindo ficar Olinda sem a preeminencia de cabeça, coarctando-se o seu termo, e já subordinada ao Recife, onde se rematam os contractos; o que deviam então fazer os do seu senado, quando não logo, correndo mais o tempo o alcançariam.

A opinião era certo perder-se da nobreza, por ficarem dos nobres, uns igualando-se aos mercadores nos logares, e outros, sendo poucos, para na cidade os encherem em todos os pelouros; e por essa falta

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